“Governabilidade e eleições”, por Marcus Pestana
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Daqui a 9 meses teremos eleições gerais no Brasil. Tudo indica que o problema crônico e progressivo da democracia contemporânea brasileira não será sanado: o descolamento das eleições presidenciais em relação às eleições parlamentares e suas consequências na sustentação política do governo.
Hoje no Brasil existem 33 partidos registrados no TSE, sendo que 24 deles têm presença no Congresso Nacional. No ciclo democrático vigente entre 1945 e 1964, UDN, PSD e PTB eram os eixos organizadores da vida política brasileira, com alto grau de consistência política e fidelização de suas bases.
Nas primeiras eleições presidenciais pós golpe de 64, em 1989, o sinal amarelo acendeu pela primeira vez, quando um jovem governador de Alagoas, com discurso populista contra os “marajás” e o “Estado elefante”, usando pioneiramente avançadas ferramentas de marketing, por um partido inexistente, o PRN, venceu nomes como Ulysses Guimarães, Lula, Brizola, Mário Covas, Aureliano Chaves e seus PMDB, PT, PDT, PSDB, PFL. Daí para a frente, o quadro mergulhou numa deterioração crescente. Veio a equivocada decisão do STF declarando a cláusula de barreira inconstitucional, a criação dos fundos partidário e eleitoral, a consolidação de uma legislação partidária e eleitoral flácida e permissiva, a pulverização disfuncional e sua consequência principal: a migração do presidencialismo de coalizão para o presidencialismo de cooptação, que resultou no mensalão e na Lava Jato.
Por isto, creio ser fundamental prestar mais atenção nas eleições parlamentares. Lula, Bolsonaro, Dória, Moro ou Ciro, definitivamente não são super-heróis salvadores da Pátria. Sem maioria parlamentar não conseguirão implantar seus programas de governo. O problema não é o número de partidos existentes. A questão central é a excessiva fragmentação da representação parlamentar e a inexistência de um núcleo majoritário que garanta apoio ao presidente da República.
Se compararmos com outros países, fica mais clara esta grave debilidade da democracia brasileira. Na Alemanha, as eleições de 2021 determinaram uma fragmentação relativa da representação parlamentar entre cinco partidos. Para dar estabilidade ao Governo de Olaf Scholz, que sucedeu Angela Merkel, socialdemocratas, verdes e liberais, selaram um Pacto de Governabilidade e um compromisso programático em torno de um texto de 177 páginas que explicita para a sociedade as diretrizes do novo governo e garante maioria para sua implantação.
Em Portugal, a chamada Geringonça Portuguesa, que viabilizou uma surpreendente estabilidade governamental de 2015 até agora, reuniu, apesar das enormes divergências, o Partido Socialista, o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista. Derrotado recentemente o Orçamento para 2022, foi dissolvido o Parlamento e novas eleições ocorrerão agora em janeiro. São as vantagens do parlamentarismo. Já Joe Biden, no presidencialismo americano, pode imobilizar seus dois últimos anos de governo, se os democratas perderem a maioria na Câmara e no Senado, nas eleições deste ano.
As mudanças na legislação partidária e eleitoral brasileira para 2022 foram periféricas. Qualquer presidente terá enorme dificuldade para formar maioria sólida e estável. Que o seja em bases programáticas, e não fisiológicas, para não repetirmos os mesmos erros de um passado muito recente.
(*) Economista e consultor do ITV, foi deputado federal pelo PSDB-MG