Os Argumentos Certos

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Opositores da reforma da Previdência dizem que ‘defendem os mais pobres’. Se o intuito de fato é este, estão do lado errado: quem perde com as mudanças é o topo da pirâmide

Lá se foi mais uma semana de idas e, principalmente, vindas no debate sobre a reforma da Previdência. O governo foi levado a ensaiar mais concessões com intuito de convencer os que se opõem às mudanças por, segundo eles, “atentarem contra os interesses dos mais pobres”. Se a preocupação é de fato esta, as razões estão equivocadas e a posição, mais errada ainda.

Os mais pobres estão do lado da equação que ganha com a reforma. Quem perde com as novas regras para concessão de aposentadorias e pensões são os ricos, os com empregos mais bem remunerados e estáveis e, sobretudo, o topo da nossa pirâmide social: a casta empoleirada no serviço público. Se há dúvida quanto a isso, aí vão alguns argumentos.

O cerne da reforma é o estabelecimento de uma idade mínima para aposentadoria, que aumentará lentamente ao longo de até 20 anos de transição. Para os mais pobres, isso não faz a menor diferença.

A grande maioria deles já se aposenta por idade – com 15 anos de contribuição ou nenhuma, no caso dos rurais – ou é contemplada pelo Benefício de Prestação Continuada (BPC), voltado a idosos carentes e deficientes – também sem necessidade de qualquer recolhimento. Tanto BPC quanto aposentadorias rurais não são atingidas pela reforma.

Quanto custa cada beneficiado? Há cerca de 10 milhões de aposentados por idade no INSS e 2 milhões de atendidos pelo BPC no país. O valor médio recebido por eles é de R$ 1,1 mil e R$ 880, respectivamente, segundo o didático estudo feito pelo consultor Pedro Nery para o Senado Federal.

Vale comparar: na outra ponta, estão 5,6 milhões aposentados por tempo de contribuição, sem necessariamente cumprir idade mínima, ou 17% do total. O valor médio que recebem é de R$ 2.300. Atente-se: dois terços dos que se aposentam por tempo de contribuição no país estão entre os 40% mais ricos da população, diz o Ipea.

Cabe agora ver quem responde pela maior fatia do déficit previdenciário, que escalou a R$ 268 bilhões no ano passado. Em termos proporcionais, a maior contribuição para o gigantesco rombo vem dos militares e, em seguida, dos servidores públicos. Neste momento, os primeiros não serão atingidos pela reforma, e parte dos segundos passará, com as mudanças, a também ter de cumprir idade mínima – os que ingressaram na burocracia após 2003 já têm.

Tal mudança visa a acabar com uma distorção que garante aos servidores admitidos antes de 2003 aposentar-se ganhando o mesmo que ganhavam na ativa, preservando os mesmos reajustes dados aos vencimentos de quem ainda trabalha. Com isso, o regime que atente apenas 900 mil aposentados pela União gerou rombo de R$ 83 bilhões em 2017. Já os quase 30 milhões de atendidos pelo INSS responderam por déficit de R$ 182 bilhões. Quem, portanto, pesa mais?

Vejamos ainda: as injustiças do sistema atual ficam explícitas quando se observa que cada um dos 20 milhões de aposentados urbanos gerou, em média, déficit de R$ 1,8 mil em 2016, enquanto um funcionário público aposentado respondeu por rombo de R$ 68 mil e um militar, por entre R$ 99 mil e R$ 127 mil (reformados), como ilustra O Estado de S. Paulo em sua edição desta sexta-feira. Onde estão as injustiças?

No frigir dos ovos, menos de 10% dos trabalhadores do setor privado teriam perdas superiores a 1% dos seus benefícios, caso a reforma passe, conforme afirmou o secretário Marcelo Caetano ao Valor Econômico em janeiro. Ou seja, poucos perderão muito pouco e muitos não perderão quase nada. Os grandes afetados serão os servidores públicos. É justo ou não é?

Se, mesmo com esta avalanche, ainda falta argumento para defender a reforma, vale usar a feliz comparaçãofeita ontem pelo secretário da Previdência do Ministério da Fazenda: apenas o rombo previdenciário registrado no ano passado seria suficiente para comprar uma empresa do tamanho da Petrobras.

Fica aí uma opção: se desistirmos de mudar nosso injusto sistema de aposentadorias e pensões, teremos que vender, todo ano, uma estatal deste porte para continuar alimentando a boca gulosa dos privilégios. De qual lado é melhor ficar?

– Carta de Formulação e Mobilização Política Nº 1736

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