Fora da ordem, fora de hora

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Não cabe ao governo que precisa enfrentar e vencer a maior crise da nossa história honrar as bombas-relógio bilionárias legadas pela gestão petista

Vai ser difícil para o governo sustentar a justeza da decisão que resultou na concessão de reajustes de bilhões de reais ao funcionalismo e na criação de milhares de cargos públicos no mesmo momento em que exige sacrifícios a granel dos brasileiros.

Na noite de quarta para quinta-feira, a Câmara aprovou projetos de lei que resultarão em aumentos salariais para 16 categorias de servidores. Segundo as contas divulgadas pelo governo, a bondade custará R$ 53 bilhões até 2018 – há quem fale em R$ 64 bilhões até 2019. Ainda falta computar o efeito em cascata nas contas de estados e munícipios, já que os subsídios do STF, que são o teto do funcionalismo, também cresceram.

O governo alega que os reajustes – média de 21% em quatro anos – já estão considerados na nova política que limita o crescimento dos gastos públicos. Pode ser. Mas, se a aritmética ainda vale, significa que, sem os aumentos, o Orçamento da União teria recursos equivalentes para aplicar em outros fins certamente mais urgentes num país em grave crise como o Brasil.

A reação da opinião pública aos aumentos aprovados anteontem na Câmara já se anunciava amarga, mas tende a tornar-se azeda. Sabe-se agora que, em meio a um dos projetos de lei que autorizaram os reajustes, também constou a criação de 14.419 novos cargos públicos, segundo informa a edição de hoje da Folha de S.Paulo. O que era indigesto ficou intragável.

E não deve parar aí. Há mais categorias com aumentos engatilhados, cujos acordos salariais também foram negociados pelo governo afastado, na véspera do impeachment de Dilma Rousseff. Poderão adicionar mais R$ 7 bilhões à conta, calcula O Globo.

O presidente em exercício argumentou que os reajustes “pacificam” a ação de alguns grupos de servidores e seus sindicatos. É ruim que o preço da trégua seja este, até porque poderá atiçar outras demandas. Se o país está a exigir sacrifícios, e está, é preciso que eles sejam de toda a sociedade, poupando apenas os que menos têm.

Os acordos salariais que desaguaram nos reajustes foram firmados ainda na administração passada. É o caso de se questionar se cabe ao governo que precisa enfrentar e vencer a maior crise da nossa história honrar estas bombas-relógio legadas pela gestão petista – o “maior passador de cheques sem fundo do planeta”, na precisa definição do ministro Bruno Araújo.

Pode até ser justo que categorias que estão com vencimentos defasados recebam aumentos – que, em alguns casos, nem repõem a inflação. Mas fica quase impossível aceitar isso quando o orçamento do país tem um rombo de R$ 170 bilhões, pelo terceiro ano seguido, e as contas federais prometem não sair do vermelho antes do fim desta década, segundo projeções do FMI.

Fica ainda mais complicado concordar com os aumentos quando a população convive com um ambiente econômico em que 11,4 milhões de brasileiros estão desempregados e, na média, 20 mil pessoas perdem seus empregos todos os dias. Mais: quando a renda média já caiu quase 10% em apenas dois anos.

O mínimo que se pode exigir é que a conta da aprovação destes reajustes não aumente a fatura que já é cobrada da população na forma de tributos. Ou seja, que não resulte na elevação de impostos existentes ou na criação de novos. O ideal mesmo seria que o Senado revisse a decisão fora de hora tomada nesta semana pela Câmara.

– Carta de Formulação e Mobilização Política Nº 1375

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