Febres de Verão

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Nos últimos anos, país voltou a conviver com doenças que se imaginava superadas. O retrocesso diz muito sobre a ineficácia de políticas públicas e a distribuição do orçamento

A cada verão, o drama se repete. Nos últimos anos, na estação das chuvas o país tem sido obrigado a lidar com doenças que imaginávamos varridas do mapa. Fica clara a imprevidência do poder público, temperada por doses de descuido também por parte dos cidadãos. Este é um Brasil que precisa mudar.

Primeiro foi a dengue. Depois vieram a zika e a chicungunya. E, desde o ano passado, o país viu ressurgir casos letais de febre amarela, endemia que nosso sistema de saúde pública havia conseguido superar – com o esforço decidido do epidemiologista Oswaldo Cruz – ainda no começo do século passado.

A situação piorou muito neste verão, a despeito de o Brasil já ter sido alvo de alerta para o recrudescimento da doença, a partir de Minas Gerais, ainda no primeiro semestre de 2017. Por questões também comerciais, há doses disponíveis da vacina em menor quantidade que o recomendável – tanto aqui quanto no resto do mundo.

O que aconteceu no último ano foi o contrário do que se exigia. As despesas com ações voltadas a vigilância epidemiológica e controle de doenças diminuíram, a população não foi devidamente informada da necessidade de vacinação massiva e milhões de pessoas que ainda precisam ser imunizadas continuaram vulneráveis à febre.

Esta não é uma condição cara ao Brasil. No mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde, ainda há até 472 milhões de pessoas que precisam tomar a vacina, mas não o fizeram – o que representa metade da população de áreas de risco que precisaria estar imunizada. No entanto, o avanço que o país conseguira no início de 1900 não permitia imaginar que retrocedêssemos a este estágio.

A eclosão recente de casos de doenças causadas por mosquitos diz muito das vulnerabilidades e ineficiências do nosso sistema público, em especial do saneamento. Também joga luz sobre a organização e estruturação do nosso orçamento público.

A saúde têm recursos garantidos, mas mesmo assim eles não chegam aonde deveriam, o que permite questionar a eficácia das chamadas “vinculações†– uma das questões centrais do novo Brasil que se pretende construir. A prevalência de despesas obrigatórias no orçamento está minando as chances de melhor aplicar os recursos finitos tomados dos cidadãos.

Assim como um século atrás a calamidade pariu uma solução, desta vez o pânico em relação à febre amarela deveria iluminar atitudes mais consistentes do poder público e mais responsáveis por parte dos cidadãos. Se o país quer voltar a ter relevância no mundo e deixar para trás o período recente de descalabro, tem de fazê-lo tanto nas grandes linhas de governo quanto nos atos do cotidiano.

– Carta de Formulação e Mobilização Política Nº 1723

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