A saúde em estado febril

Publicado em:

Por muitos anos, o Ministério da Saúde serviu mais como moeda de troca no balcão partidário do que como instrumento para melhoria de vida dos brasileiros

O sistema público de saúde brasileiro nunca primou pela excelência. Mas, além da má qualidade do atendimento prestado à população, os últimos anos foram pródigos em retrocessos. Doenças que se imaginava terem ter ficado na poeira da história voltaram com força ao país.

Primeiro foi a dengue, que recrudesceu e em 2015 registrou recorde histórico de casos e, o que é pior, de mortes – foram 863. Nas asas do Aedes aegypti vieram também a chicungunya e a zika, que, após o surto do fim do ano retrasado, já deixou mais de 2 mil crianças em todo o país marcadas pela microcefalia, de acordo com reportagem recente da AFP.

A praga da vez é a febre amarela, a mesma que os esforços de Oswaldo Cruz haviam praticamente dizimado há cem anos, confinando-a a áreas silvestres. O país vive atualmente o pior surto da doença desde que se tem registros sistematizados de casos, iniciados em 1980. As ocorrências se concentram em Minas Gerais, mas já atingem também São Paulo e Espírito Santo, com expansão acelerada.

Segundo o Ministério da Saúde, 42 pessoas já morreram em decorrência do atual surto da doença, que até o último sábado (28) tinha 87 casos confirmados e outros 442 em investigação. Os números superam as marcas de 2000, até então o pior da série histórica – nos últimos dois anos, o país registrara dez mortes causadas pela febre amarela.

O temor agora é de que a doença se alastre por centros urbanos, no que seria um desastre de proporções imprevisíveis – desde 1942 não há registros desta natureza, em que o mosquito transmissor espalha o vírus entre humanos, e estes entre si, fora das áreas silvestres, onde é comum a febre circular entre macacos. Na sexta-feira (27), a OMS emitiu alerta segundo o qual este risco “não pode ser descartadoâ€.

Neste momento, o esforço é para imunizar as populações das áreas mais diretamente afetadas pelo atual surto – sem, contudo, incorrer numa desnecessária e arriscada vacinação em massa. A Fiocruz é bastante eficiente nisso. O governo ampliou a remessa de doses de vacinas, mas nem sempre a estratégia tem efeito: em algumas regiões, a cobertura continua muito aquém do mínimo considerado seguro para evitar a propagação da doença.

O que o atual surto de febre amarela deixa de lição é o desleixo com que a saúde pública foi tratada no país nos últimos anos. Não se registram avanços relevantes no serviço oferecido à população – o Mais Médicos jamais passou de um remendo limitado – e, pior, a incúria abriu as portas do país à volta de doenças que pareciam ter ficado no século 20.

Por muitos anos, o Ministério da Saúde serviu mais como moeda de troca no balcão partidário do que como instrumento para a melhoria de vida da população. Dinheiro para realizar, tinha, mas faltou eficiência e zelo por parte dos governos do PT. Resta agora evitar que o Brasil continue a empreender uma viagem ao passado e consiga encontrar o caminho para oferecer uma saúde melhor para seus cidadãos.

– Carta de Formulação e Mobilização Política Nº 1.514

Ponto de vista

Instituto Teotônio Vilela: SGAS 607 Bloco B Módulo 47 - Ed. Metrópolis - Sl 225 - Brasília - DF - CEP: 70200-670